Quando um homem tenta dizer NÃO!

POSTADO POR: admin qui, 08 de dezembro de 2011

Eu devia ter desconfiado. Aquele gingado, aquele passo arrastado,
aquele olhar vidrado, todos os sinais indicavam que eu estava prestes a ser
abordado. Ela já me cercava há quase meia hora, enquanto dançava, corria a
língua pelos lábios e fingia girar um gelo imaginário no copo de plástico cheio
de cerveja. Foi como em um clássico do cinema de baixo orçamento, onde o
cenário era um desses clubes cafonas de cidade pequena que disfarçam o fato de
ser o mesmo lugar que seus pais frequentavam há décadas atrás com o que há de mais moderno em
questão de jogo de luz. Todo esse aparato incandescente aliado a um som estridente
em um local de péssima acústica torna o ambiente propenso à perda temporária de
alguns sentidos ou possíveis ataques epiléticos. Eu estava à beira do segundo.
Ela colocou a mão no meu peito e com três fáceis passos me fez
caminhar para trás feito um caranguejo em uma dança ensaiada, o que acabou me encurralando entre a parede e o balcão do bar. Daquela distancia, nem todas as luzes
coloridas, strobos e nem mesmo a escuridão daquele canto onde fui acuado, me
impediriam de notar que aqueles olhos azuis eram grosseiras lentes de contato. O
olhar vidrado me foi explicado, e agora era eu que não conseguia parar de olhar
para aquele truque feminino. Situação incomoda.

Não tinha como escapar. 
Iniciamos uma ‘guerra fria’ usando gestos e expressões como armas,
atacando e se defendendo como pudemos.
Ela exibiu um sorriso e eu achei prudente devolver a gentileza.
Balançou a cabeça para esquerda, para a direita, e eu acompanhei seus
movimentos na esperança de encontrar uma brecha para uma possível rota de fuga.
Foi ela quem quebrou o acordo de paz e se lançou em minha direção.
Nitidamente cansada de se insinuar, resolveu partir para o tudo ou nada, certa
de que possuía todos os atributos necessários para me ter.
Bloqueado pela parede e sem espaço para um recuo estratégico, ergui a
mão, como quem pede trégua, bloqueei seu beijo e suspendi seu fogo.

Novamente foi ela quem fez as palavras necessárias, para mim, o silencio bem poderia evitar mais uma situação incomoda.

-Você não quer ficar comigo?
-Bem,… não.
Achei que valia a pena tentar mais um sorriso, mas dessa vez não recebi a mesma
gentileza em troca.
-Como assim você não vai ficar comigo?
-Escuta, deixa eu te explicar…
-Eu não to acreditando no que eu to ouvindo. Você tem coragem de dizer
na minha cara, que não vai ficar comigo,… É isso?
-E de que outra forma seria?
-Você é gay?! Olha, por que se for,…Pode falar! Na boa, eu vou
entender.
-Gay!? Não! Jamais! De onde você tirou isso?
-É o único motivo que te impediria de ficar comigo.
-O único motivo? Já passou pela sua cabeça que eu posso ser
comprometido?
-Hum,.., nada de aliança nos dedos, então podemos descartar casado e
noivo. Então sobra namorada, o que também não é motivo para não ficarmos. Só
resta você ser gay.
-Ok, eu não sou comprometido… 
-Entendi,…
-Mas também não sou gay!
-Tudo bem, então prova gatinho. – mal terminou a frase e juntou os lábios se lançando em uma nova investida, novamente bloqueada pela palma da minha mão.
-Escuta garoto, eu já falei com a Pri, a Cá, a Lu e a Isa que nós íamos ficar, eu não posso te arrastar assim pra um canto e simplesmente voltar rejeitada. Com que cara eu vou ficar? Façamos o seguinte, a gente se beija, dançamos juntos umas três músicas, damos uma volta até o bar para sermos vistos, você me paga uma bebida e depois eu faço um showzinho qualquer dizendo que você é um cretino por ter olhado pra bunda de alguma das minhas amigas periguetes. Aí você fica livre pra sumir,… certo?
-E se eu não concordar com esse seu roteiro doentio?
-Eu faço um escândalo. 
Nesse momento me questionei se não teria
sido mais fácil ter confirmado que eu era gay quando tive a chance.