Apenas um pobre escritor

POSTADO POR: admin sex, 07 de dezembro de 2012

ou o adestramento canino governamental
(Um pensamentozinho bem etílico)
Você já sentiu vergonha de dizer a
alguém que não tinha dinheiro? Esses dias eu senti, confesso, mas depois gastei
um bom tempo pensando na questão. Acho que a vergonha que senti não foi pelo
dinheiro em si, mas pela inversão das coisas (valores) em minha vida, a
confusão que se criou entre o parecer e o ser.
– Quantos livros você já publicou?
– Oito.
– Qual a sua profissão?
– Escritor.
– E o que mais?
– Mais nada.
– Como assim mais nada?
– Mais nada, cara, eu escrevo um
monte de coisas, o resto do tempo eu passo lendo, pensando na vida e nas coisas
que eu li. Larguei do mundo.
– Você está desempregado, é isso?
– Não, eu vivo do que pintar nas
vendas dos livros, mais os freelas.
– Você é
doente.
– Sim.

Este é o quadro. A maioria dos
escritores precisa trabalhar para não levar a vida tosca que eu levo; a escrita
deles caminha ao lado do prazer no tempo livre, enquanto que a manutenção da
vida é substanciada de outras maneiras. Então, às vezes eles me convidam para alguma
convenção ou feira literária, e o valor de participação a ser pago (insignificante
para a maioria) é o meu ganho mensal… Preciso engolir a vergonha para pedir
descontos choramingosos, ou
possibilidade de parcelamento. Sinto que perco o crédito com meus colegas de
profissão. Vejo meus rabiscos na Saraiva, Cultura e Travessa, mas não tenho
grana para chegar até os leitores, participar mais ativamente da cultura
nacional, nada.
Sabem quanto o escritor ganha? No
máximo 15% da venda em um bom contrato, o que significa que 85% do lucro irão para
editores, distribuidoras e livrarias. 
Quem vende uma média regular de livros
(quem não é best seller) costuma ficar na corda bamba ou com a corda no pescoço.
É quase um jogo depender de literatura, os autores me fazem lembrar aquele mar
de velhinhos com a cara no vídeo bingo, esperando o número da sorte para gritar
sua redenção.

BINGO!

BEST SELLER!

FODA-SE!


Portanto, meu amigo, se você é um candidato a escritor pense
bastante, faça por amor ou não faça nada. A coisa aqui é complicada, fedida, desleal,
empedrada, maquiada, e quando um fulano com bastante grana resolve ser escritor
ele larga na tua frente com 800 metros de vantagem e passadas largas. 
A grana
traz boa assessoria, profissionais que até reescrevem o livro do cara para vender
melhor, divulgação em grandes veículos de comunicação, indicações editoriais, possibilidade
para aparecer em todos os eventos literários, livrarias, vitrines. A grana traz
mais grana, como é de costume no meio cultural brasileiro. O pobre (e de
pobreza eu entendo) é adestrado caninamente para ser mão de obra barata nas
empresas, servidor público ou militar.