Acordando em maus lençóis

POSTADO POR: admin dom, 26 de agosto de 2012

Um
pequeno raio de sol irrompeu por entre uma brecha da persiana torta que
precariamente cobria a única janela do ambiente. Iluminando micropartículas de
poeira, ele foi traçando um caminho que acabou bem nos olhos fortemente fechados
de Cristovão que só fez virar o corpo para a parte interna da surrada cama de
casal, aproveitando o movimento para se enroscar um pouco mais na coberta.
Ele
já estava para acordar, mas queria desfrutar um pouco mais de toda aquela
calmaria, e até mesmo do desconforto oferecido por um colchão desconhecido.
Todo aquele silencio. Ouvir apenas a sua própria respiração sonolenta, que
apesar de um pouco alta, nem chega a se classificar como um ronco.
Por
alguns instantes, pode-se dizer que chegou a sorrir.
Ainda
de olhos fechados, deu uma grande bocejada com direito a esticada de braço e
tudo o mais. Até tentou espreguiçar-se, mas teve a intenção bloqueada por
alguém ao lado com quem, sem saber, dividia aquela cama.
Ao
leve contato, Cristovão ficou paralisado. Simplesmente imóvel. Nem pra abrir os
olhos arrumou coragem. Optou pela prudência e ficou ali quietinho fazendo uma
retrospectiva mental da noite anterior, na esperança de colher fragmentos que
revelassem a identidade da pessoa ao lado de forma que se evitasse qualquer
tipo de constrangimento. Foram alguns longos segundos meditando dobre o caso e
tudo que ele conseguiu foi aumentar sua dor de cabeça. No minuto seguinte
desistiu de tentar adivinhar quem era a pessoa estranha e só conseguia imaginar
se ela teria um analgésico.
Sem
opções, ele foi abrindo os olhos aos poucos, ao mesmo tempo em que apalpava o
que seria um braço desconhecido. Foi justamente ao tocar em um bíceps bem
definido que Cristovão deixou de cerimônias e arregalou logo os olhos se vendo
segurar nos músculos de um garotão que aparentava ter a metade de sua idade.
-Mas
que merda é essa…?!
Ao
ouvir tal exclamação, o rapaz despertou no susto e se descobriu deitado na cama,
face a face com aquele desconhecido que aparentava pelo menos o triplo de sua
idade.
-Ahhhhhhhhrrrg!!
Os
dois gritaram juntos, mas saltaram para fora da cama por lados opostos,
buscando a maior distancia possível um do outro. Encaram-se assustados e ao
notarem que ambos estavam nus, pularam novamente para a cama onde agarraram as pontas
da coberta e iniciam uma espécie de disputa, quase que como um cabo de guerra,
pela posse do pano que cobrisse suas vergonhas.
Enquanto
puxavam a coberta, foi Cristovão que iniciou uma ferrenha discussão, acalorando
ainda mais a situação.
-Mas
o que está acontecendo aqui? É algum tipo de novo golpe na praça?
-Qual
é meu tio? Tô sabendo de nada não. Só quero saber como que tu me arrastou pra
cá?
-Arrastei
pra cá? Eu que quero saber como cheguei aqui. Você me drogou? Foi isso?
-E
você acha que eu ia desperdiçar alguma droga em uma bicha velha, feito você?
-Bicha?
Velha? Aí moleque eu não sou velho. E muito menos viado. Você me respeita heim!

A
coisa toda só se resolveu quando o som de uma descarga acionada ecoou por trás
de uma porta de madeira mal pintada de um amarelo descascado que na pior das
hipóteses indicava um banheiro. Voltando sua atenção para o barulho curioso, o
rapaz acabou soltando sua ponta da coberta e deixando que a física fizesse o
resto. Devido à força que fazia, Cristovão foi projetado para trás e rolou pelo
menos duas vezes no chão antes de parar na parede oposta, perto da janela. Sem
se dar conta do evento, ele se levanta com a pose de um vencedor que acabou de
ganhar uma batalha e se enrolou com a coberta improvisando em uma espécie de
toga.
-Você
ouviu isso?
– perguntou o rapaz enquanto Cristovão terminava de fazer uma
amarra na coberta.
-Ouviu
o que?
-Naquela
porta. Ali é o banheiro?
-Não
sei. Mas se for uma saída, eu já fico feliz.
-Fica
quieto e escuta, mané. Nós não estamos sozinhos.
-O
que? Quer dizer que você trabalha com algum cúmplice?
Devido
a tensão desenvolvida do ambiente, desta vez ninguém conseguiu ignorar o som do
trinco da porta que reagiu alto ao ser destrancado. Os dois pararam em
silencio, mal respiravam enquanto observavam a estranha figura que saia do
banheiro e adentrava no quarto.