A fábula quase heroica de um vagabundo falador

POSTADO POR: admin sex, 10 de janeiro de 2014

Depois que a garrafa de Salton já estava pela metade, bateu aquela
vontade (bem típica de alguns bebuns) de falar com todo mundo.
– Alô, Pitz é você?!
– Fala Moura seu puto, vagabundo, ordinário!! O que você está
fazendo aí? De certo está coçando a bunda e o ovo esquerdo..
– To trabalhando animal, esperando pra ser atendido aqui na loja
de um dos clientes..
– Saquei.. Tá calor aí?
– Não… São Paulo no inverno é fresquinho.
– Vá se foder.. Estou brindando em sua homenagem.
– Tenho que desligar, depois a gente se fala.
– Vá se lascar. Até mais ver.

Vejamos quem mais eu posso importunar agora…? Pensava e
procurava na agenda os números todos, na esperança de alguém vivo para passar o
tempo trocando algumas palavras de hipocrisia, qualquer coisa.
– Allan??
– Oi Laurinha!! E aí, tudo maré mansa?
– Está bêbado?
– Nunca! Só tomei o meu vinho da tarde.. E aí, muito trabalho na
redação?
– Sim, até demais, o meu chefe é um escroto..
– Quer te comer?
– Acho que sim.
– Vai liberar para ele?
– Não!
– Faz bem.. Faz muito bem.
– Quer que eu libere pra você é?
– Agora não, antes eu queria sim. Já quis muito transar de novo
contigo… Muito mesmo.
– Que horror.. Tá apaixonado agora, né doutor solidão?
– Sim, to com tudo pra ser corno de tão apaixonado. Uma droga.
Como diria o velho safado ‘o amor é um cão dos diabos’.
– Ih, gatinho, lá vem o babaca… Vou desligar. Segura a onda do
vinho aí tá. Beijão.
– Tá certo Laurinha. Beijão!
O que fazer se todos os seus amigos trabalham em tempo integral..?
Uma parte deles chega do trabalho e ainda cuida da casa, dos filhos, das
contas, da porra toda… E você tem 31 anos e ainda vive de bicos e livros, a
conta bancária quase sempre no negativo, o carro velho se desmontando em cada
lombada.. O vinho me alegra falsamente a solidão, mas é na solidão do sonho que
me vejo vivo, e me vejo vinho.. Trabalhar em tempo integral? Talvez.. Casar?
Talvez… Mais vinho? Certamente. Casar… Sim, talvez.
– Pitz… O que você quer?
– Porra, que alegria na tua voz Geraldo!
– Estou no escritório..
– Já saquei.. senti o cheiro de bunda suada na cadeira aqui de
longe..
– Vá pro inferno..
– Estou nele, meu amigo! Estou nele! Diz aí, qual a boa de sexta?
– Descansar e curtir com a minha noiva. Você não está namorando
agora?
– Estou sim..
– Então vá encher o saco dela.
– Tá certo.

O Geraldo tinha razão… Liguei para a minha garota e o papo fluiu
por duas horas.. Fiquei até sabendo que o homem basicamente não descende do
macaco, entre outros papos muito loucos que só uma cientista doida (e genial)
consegue conduzir. Enquanto ela falava e falava e falava eu agradecia de
coração ao anjo maluco que a trouxe. Espero que fique.
(Primeiro texto de 2014.. mais um ano de coluna invisível pela
frente!)