5 Indícios de que estamos vivendo mais uma época de ‘queima de livros’

POSTADO POR: admin sáb, 05 de abril de 2014

Eu costumo dizer que a literatura passou por três períodos terríveis na sua história em que o ódio ao intelectualismo incendiou injustificáveis piras de livros acesas pelas mãos da inquisição, dos nazistas/comunistas, e da minha própria família numa fase de surto religioso.
A queima de livros é um antigo símbolo de intolerância que, por incrível que pareça, não está assim tão longe da nossa sociedade moderna. Pode acreditar, enquanto você lê este texto, centenas de livros estão ardendo em chamas nesse momento. E eu queria aproveitar o ensejo para explicar o por que…

✔ Alguma biblioteca está fazendo isso bem agora
E eu não estou falando apenas daquela biblioteca furreca de alguma cidade pequena do interior. A destruição de livros está ocorrendo em escala industrial na Biblioteca Britânica, possivelmente, uma das bibliotecas de maior prestígio no mundo. Recentemente, o mesmo aconteceu na Universidade de New South Wales, na Austrália, assim como em várias outras instituições. 
A questão é que quando as livrarias começaram a falir no início deste ano, os burocratas decidiram destruir todos os livros não vendidos em vez de doá-los.
E, desta vez, essa não é uma conspiração soviética secreta conduzida pela Nova Ordem Mundial. As razões são bem mais mundanas e estupidas que essa.
✔ Sai mais barato que doá-los
A primeira, e mais óbvia, objeção é: Por que não dar os livros para os pobres? Eles precisam de coisas para ler. Ou para os presos? Ou para crianças doentes? Ou mesmo para os livreiros independentes? Não custa nada doar algo, certo?
Não é tão fácil quanto parece. Um livro de biblioteca é carimbado e catalogado para deixar claro sua procedência. Quando um livro é doado ou vendido, a biblioteca tem que remover todas essas marcas ou o novo proprietário não teria como provar que o exemplar não foi simplesmente roubado da prateleira. 
E estamos falando de um monte de livros aqui. Estas bibliotecas estão sendo obrigadas a reduzir seus estoques ao mínimo possível. Imagine que você é o gerente de uma biblioteca, e alguns contadores dizem que você precisa se livrar de 100 mil livros no prazo de uma semana. Você realmente tem duas opções… Uma, você pode ter um monte de acadêmicos dispostos a vasculhar sua coleção e avaliar meticulosamente cada livro de acordo com o seu valor e importância, depois contratar um monte de gente para separar os livros menos importantes e meticulosamente retirar o carimbo de um por um. Ou a segunda opção, que seria contratar meia dúzia de pessoas com braços fortes para passar o dia jogando os livros em uma máquina de trituração.
Essa segunda opção é muito mais rápida e barata. Depois você pode encontrar um centro de reciclagem de papel que pote pagar um bom dinheiro por esse monte de retalhos, de modo que, destruir livros pode até gerar um bom lucro. Ninguém gosta disso, mas para um bibliotecário é como se o seu melhor amigo tivesse acabado de ser mordido por um zumbi, e você fosse o único com uma arma por ali.
Além disso, vários exemplares de valor histórico estão sendo enterrados entre um monte de outros livros que são, basicamente, lixo. Embora todo mundo perceba que alguns livros raros estão sendo inevitavelmente destruídos com outros de baixa qualidade, não há muito o que se fazer a respeito. Ninguém vai pedir uma primeira edição de Moby Dick de uma biblioteca se a reimpressão de 2013 está bem ali na prateleira. A lista de computadores que classifica os livros por popularidade é incapaz de fazer esse discernimento.
Outra desvantagem desta opção é que você tem que garantir a aniquilação total. Não pode simplesmente jogar os livros no lixo pra algum idiota vir a pegar mais tarde. Você não vai querer ver a sua lixeira rodeada de gente como se fosse uma barraca de feira em promoção, isso é perigoso e confuso para todos os envolvidos.
E se algum mendigo se deparar com algum tesouro perdido do século 16, a biblioteca não pode permitir que ele fique com o livro, ou estaria incentivando os funcionários a cobiçar o mesmo, em vez de eliminá-los. A ordem de cima é “sem misericórdia”. É mais fácil jogar livros fora se você não sabe o que são ou do que se trata.

✔ Tudo tem que ser feito em segredo
Se você não sabia nada sobre isso, é porque destruir livros é um trabalho que, por necessidade, deve ser feito em segredo. Certamente isso viria a público caso alguém inadvertidamente encontrasse um monte de livros em uma lixeira. A biblioteca não vai anunciar que eles estão fazendo isso, mas você pode encontrar o assunto sendo discutido entre bibliotecários em alguns grupos fechados de redes sociais.
Em 2004, a Universidade de Victoria, na Nova Zelândia, decidiu que teria que destruir cerca de 130.000 livros. Mas eles tiveram uma crise de consciência, e revelaram seus planos para os acadêmicos do corpo discente. A ideia era que eles resgatassem alguns livros condenados driblando a burocracia, e se alguém quisesse salvar algum livro, eles precisariam apenas cobrir o carimbo da biblioteca com uma tarja preta feita com caneta piloto.
Previsivelmente, todos foram a favor. Um professor enviou um e-mail para todo o corpo docente convocando uma campanha em que funcionários e alunos passaram pela biblioteca armados com canetas piloto e marcando livros para a retenção.
✔ As bibliotecas não conseguem crescer rápido o suficiente
Se já é triste assistir as bibliotecas sendo forçadas a destruir suas coleções por causa de uma implosão na economia, imagine então quando milhares de livros e jornais da virada do século passado são ‘aterrados’ porque a biblioteca quer instalar um novo café?
Mas isso é o que está acontecendo na Universidade de New South Wales, na Austrália, onde os livros e jornais que remontam à década de 1850 foram desalojados para dar lugar a mais espaço social, sala de estar e computadores, o que o professor Peter Slezak descreve como: “Transformar a biblioteca em uma espécie de Starbucks.”
Mas vamos olhar um pouco pelo ponto de vista da biblioteca. Os alunos e usuários da biblioteca estão exigindo essas coisas. O fato do lugar abrigar alguns milhares de livros não basta, eles também precisam fornecer um espaço adequado para as pessoas, bem, poderem ler os livros.
E lembrem-se que os editores ainda estão produzindo novos livros aos milhões. Assim, a biblioteca vive um dilema para acomodar todos os novos livros, e também proporcionar um ambiente para que todos possam pedir um cappuccino e colocar os pés para cima.
Então por que não construir um novo piso? Bem, o problema é que ninguém quer financiar isso. Uma biblioteca, afinal, não é o tipo de investimento de onde se retira muito lucro. Quando foi a última vez que você entrou em uma biblioteca e pagou por isso? Mesmo as taxas de livros atrasados são risíveis. Então, quando a biblioteca diz: “Precisamos de dinheiro para expandir”, os organismos de financiamento ajustam seus óculos e respondem: “Encontrem outra forma.” 

✔ Os livros estão se tornando digitais
Vamos encarar os fatos, os livros estão saindo de moda de qualquer forma. Nos últimos três meses de 2010, os e-books começaram a vender mais que os livros de papel na Amazon. E-books não ocupam qualquer espaço físico, você pode armazenar uma infinidade deles em um disco rígido. Quando toda a sua biblioteca local pode ser substituída por um drive USB do tamanho de uma unha, a única coisa que impede que os livros ardam em um forno de tamanho industrial, é que as pessoas ainda conservam um estranho gosto pelo exemplar impresso. E não há muito espaço na economia moderna para esse tipo de predileção.
Na verdade, a discussão sobre este processo começou cerca de três décadas atrás. E não seria a digitalização real que resolveria os problemas de espaço das bibliotecas, mas uma nova tecnologia chamada ‘microfilme’. Ao digitalizar livros e jornais em microfilmes, uma biblioteca inteira cheia de livros poderia caber em um armário.
Mas esse é o mundo real, e ele é executado em um trem feito de dinheiro, trilhos feitos de papelada e movido pela burocracia.